Descoberta

Para M.

Começa assim:

o sorriso no semblante dela.

Nas sobrancelhas dele, o susto.

A sensação imprecisa

espraiando-se em ambos

e amanhecendo um sol

em suas madrugadas.

Era o início dos dias,

eles sorvendo cada instante

em suspiros, suores e certezas,

os sonhos já saindo do escuro.

As semelhanças surgiam

tão facilmente

quanto a simetria dos opostos.

Mas,

quando em posturas dissidentes,

insistiam:

“Empreste-me seus olhos

e dissiparei o seu pesar.”

E se havia solavancos,

bastava amaciar os abraços

Para que o sofrer se desmanchasse

no desespaço.

Sopram as horas,

os dias alçam voo

até que pousam numa noite singular:

o céu da cidade reluz,

uma caixa se abre,

a brisa se aquieta.

Suspense...

E o Sim ressoa!

E as estrelas se acendem!

E os braços se abrem!

E São Paulo observa o instante exato

em que eles alcançam o céu

Não há como cessar as estações.

Os meses deságuam no próximo verão

quando os convidados se reúnem.

Apenas um se atrasa,

mas logo surge, solene:

o Sol, todo vestido de azul

para abençoar

os votos,

a valsa,

e os dois

dançando qual fitas de cetim

nas pontas de um laço:

o início de um lar.

O tempo vai tecendo suas linhas

e nelas, eles seguem.

Sem visões de vidas passadas,

sem anseios por vidas póstumas,

pois foi nesta vida em que se encontraram

e é nela que desafiam todas as sombras:

as que os cercam

e as que se formam sob a tez.

Às vezes, silenciam juntos nas despedidas

(tantos sopros, tão cedo extinguidos…)

Mas,

mesmo que a ceifa os assuste,

que a concha se feche,

que o sol escureça,

insistem:

“Empreste-me seus olhos,

chorarei seu pesar.”

E é o suficiente.

E assim, lá vão eles,

cada dia o início dos dias.

Seguem de mãos dadas,

sonhando com castelos,

sobrevoando oceanos,

celebrando conquistas,

seguindo a História

(enquanto a sua, silenciosa, vai surgindo),

até o instante em que perceberão,

com susto nos olhos e sorrisos no semblante:

É isso!

É isso o que significa

“Felizes para sempre.”

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